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Motim do Wagner gera dúvidas sobre futuro de Putin e Prigozhin e expõe fissuras na máquina de guerra russa

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O final de semana foi marcado pela rebelião de Yevgeny Prigozhin, líder do grupo paramilitar Wagner, contra o governo do presidente russo, Vladimir Putin. A insurreição comandada pelo empresário ocorreu depois que Prighozin acusou o Exército russo de ter atacado um grupo de seus mercenários que lutavam na retaguarda das forças russas na Ucrânia.

Entre sexta-feira (23) e sábado (24), os militares de Prigozhin avançaram pelo território russo, tomando o controle da cidade de Rostov-on-Don, que fica no sul da Rússia e abriga a sede do distrito militar do sul do país. Em seguida, Prigozhin deslocou seus soldados para marchar até a capital russa, Moscou.

A rebelião teve fim no sábado, após o ditador de Belarus, Alexander Lukashenko, anunciar que havia mediado um acordo entre o Kremlin e Prigozhin, para que o líder do Wagner fosse exilado no país vizinho e perdoado pelo seu crime de revolta armada.

Imagem de Putin e da Rússia manchadas

Mesmo após o fim da confusão, a rebelião de Prigozhin deixa algumas manchas na imagem do governo de Vladimir Putin. A revolta foi um dos maiores desafios enfrentados pelo presidente russo, já que Putin viu um de seus principais aliados se voltar contra ele e expor as fissuras de seu poderio militar.

Analistas apontam que a
rebelião desferiu um golpe severo na imagem e autoridade do presidente, bem
como demonstrou o quão defasadas estão as defesas do país, que até o momento
ainda investe suas forças na invasão à Ucrânia.

Peter Rutland, professor da Wesleyan University e especialista em nacionalismo, política e economia russa contemporânea, afirmou em artigo no site The Conversation que a “insurreição de Prigozhin perfurou a imagem de ‘homem forte’ de Putin, tanto para os líderes mundiais quanto para os russos comuns”. De acordo com ele, Vladimir Putin foi incapaz de fazer algo mais concreto para tentar paralisar o avanço das tropas do Wagner dentro do território russo.

“Putin foi forçado a fazer um discurso televisionado às 10h, horário local, em 24 de junho, descrevendo a revolta como uma ‘punhalada nas costas’ e pedindo uma punição severa para os rebeldes”, disse o professor. Ele seguiu afirmando que foi a intervenção de Lukashenko que pôs fim ao motim, “não quaisquer palavras ou ações de Putin. De forma um tanto incomum, tanto Prigozhin quanto Putin exerceram a moderação e recuaram”, completou.

Situação de Prigozhin e do grupo Wagner

Ainda não se sabe ao certo o paradeiro de Yevgeny Prigozhin. No domingo (25), seus homens deixaram Rostov-on-Don sob aplausos e manifestações de apoio. Muitos naquele momento viram em Prigozhin a figura do homem que luta pela “soberania russa e contra os traidores da nação”, mas para membros do governo de Putin, é muito provável que o líder do Wagner seja classificado como um eterno traidor.

A procuradoria-geral russa chegou a abrir um processo criminal contra Prigozhin por incitação à rebelião armada na sexta-feira, mas informações lançadas após o acordo alcançado no sábado apontaram que esse processo havia sido encerrado. No entanto, nesta segunda-feira (26), o site de notícias russo Kommersant afirmou que Prigozhin ainda seria processado pela rebelião, contrariando as informações divulgadas no dia em que o acordo foi divulgado.

A verdade é que neste momento
a situação de Prigozhin e do grupo Wagner é extremamente incerta e delicada.
Ninguém de fato sabe o que pode ocorrer com o empresário russo nos próximos
dias ou meses, nem o que pode acontecer também com os soldados que decidiram
seguir seu líder na revolta contra o Kremlin.

Do outro lado, os combatentes do Wagner neste momento estão sem um norte, pois perderam a confiança e o apoio do governo russo, seu principal patrocinador e cliente. Apesar disso, o grupo ainda tem um grande contingente de homens espalhados por diversos conflitos na Síria, na Líbia, pela África e principalmente na Ucrânia, onde estavam sendo um dos principais atores da invasão russa.

Talvez o futuro do grupo
Wagner dependa especialmente da capacidade de Prigozhin de se manter no exílio
em Belarus e de encontrar novos aliados e fontes de financiamento. Também pode
depender diretamente da reação do governo russo, que nas próximas semanas pode
tentar desmantelar ou controlar os mercenários, como já vinha querendo fazer nos
últimos tempos.

Nesta segunda-feira, em suas
primeiras palavras após a rebelião do fim de semana, Yevgeny Prigozhin disse
que a ideia da revolta era manter o grupo paramilitar vivo. O agora ex-aliado
de Putin afirmou que o Wagner corria risco de “desaparecer” a partir de julho,
que foi a data estipulada pelo ministro da Defesa russo, Sergey Shoigu, para
que todos os “voluntários envolvidos na guerra na Ucrânia” assinassem contratos
de defesa com o governo para se tornarem grupos militares legalizados.

Prigozhin disse que “apenas alguns combatentes do exército privado aceitaram assinar o contrato com o Ministério da Defesa” e acrescentou que a obrigação de se subordinarem a Shoigu e ao chefe do Estado-Maior russo, general Valery Gerasimov, foi colocada em cima da mesa “no momento errado”.

O chefe do Wagner não deu detalhes sobre o seu paradeiro atual ou planos futuros, mas reiterou que seu objetivo não era derrubar o governo de Putin.

“A nossa marcha trouxe
para a mesa muitas coisas que já tínhamos falado antes: os graves problemas de
segurança em todo o país. Bloqueamos todas as unidades militares e aeródromos
que se encontravam no nosso caminho. Mostramos o nível de organização que o
Exército russo deveria ter”, disse.

O impacto da rebelião na invasão russa à Ucrânia

O grupo Wagner tem desempenhado um papel fundamental na invasão russa à Ucrânia desde a anexação da Crimeia, em 2014. Desta vez, os militares de Prigozhin estiveram presentes em diversas frentes de batalha no solo ucraniano e estima-se que dezenas de homens do Wagner tenham participado da ofensiva russa que capturou algumas cidades no país vizinho, incluindo Bakhmut, cidade estratégica que fica ao leste da Ucrânia.

Com a revolta deste final de semana, é difícil enxergar que o Wagner continue tendo uma presença constante na guerra, já que estão sem o seu principal líder e com sua reputação queimada perante o governo russo. Embora militares do Wagner que não participaram da revolta tenham sido autorizados a assinar contratos com o Ministério da Defesa russa – como parte do acordo feito no sábado –, é provável que o contingente de homens do grupo seja menor no conflito a partir de agora.

Já a Ucrânia muito provavelmente vai tentar capitalizar neste momento um pouco do caos causado por Prizoghin na Rússia a seu favor, principalmente na propaganda de guerra, ao apontar a desorganização e falta de liderança dentro das forças militares russas.

O secretário do Conselho de Segurança Nacional e Defesa da Ucrânia, Oleksy Danylov, disse no Twitter que a rebelião é “a ponta do iceberg de um processo de desestabilização” no alto comando de Vladimir Putin. Para ele, a rebelião de Prigozhin representou o início do “desmantelamento de Moscou”.

Mikhail Podoliak, membro do gabinete presidencial da Ucrânia, também afirmou no Twitter que o motim do Wagner foi “fenomenal” e “quase anulou Putin”. Ele seguiu dizendo que Prigozhin “humilhou” o líder do Kremlin e provou que Putin não tem o “monopólio da violência”.

James Horncastle, professor de relações internacionais na Simon Fraser University, escreveu em artigo para o site The Conversation que “a insurreição de curta duração ainda pode ser um ponto de virada na guerra na Ucrânia, mas como isso mudará o conflito ainda é incerto”.

Para o professor, a revolta de Prigozhin “ainda pode fornecer a Putin uma maneira de encerrar o conflito e salvar sua imagem”, pois, “desde o início do conflito, Putin sabia que não podia se dar ao luxo de sofrer uma derrota na Ucrânia” e que “se ele puder transferir a culpa pela derrota [da Rússia na Guerra] para um ou vários bodes expiatórios – como as forças do Grupo Wagner ou outros grupos paramilitares que ainda estão agindo na Ucrânia –, a revolta [do Wagner] pode ser uma rampa de saída perfeita”.

FONTE: Gazeta do Povo