Na primeira entrevista concedida a um jornalista do Ocidente
desde o início da invasão à Ucrânia, há dois anos, o presidente russo, Vladimir
Putin, disse ao americano Tucker Carlson que o país vizinho é um “Estado
artificial” e culpou o Ocidente pela continuidade da guerra.
A entrevista gravada foi veiculada na noite desta quinta-feira (8) no X e no site oficial de Carlson, ex-âncora da Fox News que tem quase 12 milhões de seguidores na rede social de Elon Musk.
Putin abriu a entrevista repetindo o argumento que havia
apresentado em fevereiro de 2022, quando a guerra começou: a Rússia e grandes partes
da Ucrânia têm uma ligação histórica e étnica e o segundo país nunca chegou a
ter uma identidade própria e coesão territorial de fato, que teriam sido criadas
pelos bolcheviques.
“Temos todas as razões para afirmar que a Ucrânia é um Estado
artificial, estabelecido pela vontade de Stálin”, disse.
Putin disse a Carlson que dois fatos o levaram a invadir a
Ucrânia: o que chamou de “golpe”, em referência à destituição do presidente
pró-Rússia Viktor Yanukovych em 2014; e a suposta recusa da Ucrânia a
implementar os Acordos de Minsk, estabelecidos para parar a guerra entre
separatistas pró-Kremlin e os ucranianos na região do Donbass.
O presidente russo também disse que, numa conversa com o
ex-presidente americano Bill Clinton (1993-2001), perguntou se seria possível a
Rússia ingressar na OTAN, a aliança militar do Ocidente, mas que, após o
democrata consultar assessores, recebeu um “não” como resposta.
“Percebemos que não éramos bem-vindos lá”, afirmou Putin,
que alegou que, apesar de “promessas”, a OTAN continuou expandido rumo ao leste
europeu e que Moscou “nunca concordou” com a entrada da Ucrânia na aliança
militar.
Também disse ter arquivado um comunicado em que a CIA admite
que está aliada à oposição na Rússia para derrubá-lo.
Sobre a relação com os americanos, o russo desconversou
quando perguntado se uma mudança de presidente nos Estados Unidos poderia mudar
o rumo da guerra na Ucrânia.
“Você acabou de me perguntar se outro líder poderia chegar e
mudar alguma coisa. Não se trata do líder”, disse Putin.
“Não se trata da personalidade de uma pessoa em particular.
Tive um relacionamento muito bom com, digamos, [George W.] Bush [2001-2009]. Eu
sei que nos Estados Unidos ele era retratado como uma espécie de garoto do
campo, que não entende muito das coisas. Garanto-lhe que este não é o caso”,
disse Putin, que afirmou que também teve um bom relacionamento com outro
presidente republicano, Donald Trump (2017-2021).
“Não é uma questão de personalidade do líder, é sobre a
mentalidade das elites. Se a ideia de dominação a qualquer custo, baseada
também em ações enérgicas, dominar a sociedade americana, nada mudará. Só vai
piorar”, afirmou.
A respeito do atual presidente americano, Joe Biden, Putin
disse que não se lembrava da última vez que tinha falado com ele, mas que antes
da guerra afirmou ao democrata que considerava que ele estava cometendo “um grande
erro, de proporções históricas, ao apoiar tudo que está acontecendo lá
[Ucrânia]”.
Putin fez acusações sobre a explosão dos gasodutos Nord
Stream, em setembro de 2022. Quando Carlson perguntou sobre quem foi o
responsável pelas explosões, o presidente russo respondeu: “Vocês, é claro”,
referindo-se aos Estados Unidos. “Talvez você [Carlson] pessoalmente tenha um
álibi, mas a CIA não tem”, ironizou.
Putin também acusou o Ocidente de fomentar a continuidade da
guerra contra a Ucrânia. “Estamos dispostos a negociar”, disse. “[A culpa] é do
lado ocidental, e a Ucrânia é obviamente um estado-satélite dos Estados Unidos”,
alegou.
Porém, disse que a Rússia ainda não atingiu seus objetivos
na Ucrânia, como a “desnazificação” do país vizinho. Por outro lado, negou ter intenção de invadir
outros países da região, como Polônia e Letônia.
Perguntado sobre o jornalista americano Evan Gershkovich,
preso na Rússia no ano passado por acusações de espionagem e cuja liberdade
Carlson pediu, Putin disse que uma negociação para uma troca por um prisioneiro
russo está em andamento.
Polêmica
A entrevista, gravada na terça-feira (6) em Moscou, causou
polêmica antes mesmo de ser veiculada, porque Carlson disse que “nenhum
jornalista do Ocidente se deu ao trabalho” de entrevistar Putin desde o início
da guerra na Ucrânia.
Porém, o Kremlin informou que recebeu “inúmeros pedidos” de
entrevistas com o presidente russo de jornalistas ocidentais, que foram negados
porque Moscou considera tendenciosos os órgãos de imprensa que fizeram as
solicitações.
No vídeo em que anunciou a entrevista, Carlson disse que a
maioria dos americanos “não está bem informada sobre a guerra”, mas “deveria,
porque está pagando por grande parte dela de maneiras que ainda não percebeu totalmente”.
“Não estamos aqui porque amamos Putin, estamos aqui porque amamos os Estados Unidos, e queremos que eles permaneçam prósperos e livres”, afirmou.
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