Um relatório da organização Ajuda à Igreja que Sofre (ACN, na sigla em inglês) divulgado em junho colocou a Argentina, o Chile e o México na categoria “sob observação” no que diz respeito à liberdade religiosa.
A ACN é uma organização humanitária católica sediada na Alemanha. Foi fundada em 1947 para ajudar refugiados de guerra e desde 2011 é reconhecida como fundação papal. Apesar de ser uma organização cristã, seu relatório sobre liberdade religiosa abrangeu opressões a praticantes de vários tipos de religiões.
O documento posicionou países em três categorias. A categoria vermelha, que indica a existência de perseguição religiosa, incluiu 28 países, onde moram 4,03 bilhões de pessoas, mais da metade da população mundial. A Índia e a China, os dois países mais populosos do mundo e onde a ACN destacou a opressão a muçulmanos e cristãos, receberam essa classificação.
A categoria laranja, onde ocorre discriminação, incluiu 33 países, onde vivem quase 853 milhões de pessoas. Na categoria “sob observação”, foram incluídos países onde foram registrados episódios preocupantes de desrespeito à liberdade religiosa nos últimos anos, mas sem perseguição e discriminação sistemáticas (ao menos por enquanto).
Os países considerados como tendo mais liberdade religiosa não foram classificados – entre eles, estão os Estados Unidos, toda a Europa ocidental e o Brasil.
Nas Américas, sete países foram incluídos em alguma das três categorias no relatório da ACN. Nas duas classificações mais graves, estão as três ditaduras do continente, Nicarágua (incluída na categoria perseguição, devido à repressão do ditador Daniel Ortega aos católicos), Cuba e Venezuela (discriminação), além do Haiti (discriminação), que vive uma grave crise política, social e de segurança.
Argentina, Chile e México, em tese democracias estáveis, ao contrário dos outros países americanos citados, foram colocados na categoria “sob observação”. Veja abaixo alguns dos principais argumentos da ACN para essa classificação:
México
A ACN destacou reações após manifestações de rejeição ao aborto no país presidido por Andrés Manuel López Obrador. Em julho de 2021, uma deputada denunciou ter sofrido ameaças de morte e “assédio político e jurídico
por sua postura em defesa da vida e da família”.
No mesmo ano, destacou a ACN, a Corte Suprema de Justiça do México (SCJN) invalidou um artigo da Lei Geral de Saúde que reconhecia a objeção de consciência em casos de aborto “para médicos e enfermeiros, limitando-a a apenas quando a vida da paciente é colocada em risco ou é uma emergência”.
O relatório também destacou informações do jornal La Lista e do Centro Católico Multimedia de que pelo menos sete padres foram mortos no México entre dezembro de 2018 e junho de 2022, em meio à violência perpetrada pelos grandes cartéis de drogas. Casos de vandalismo de igrejas também foram documentados.
Em 2021, membros do clero mexicano foram condenados por proselitismo político por terem publicado vídeos nas redes sociais durante a campanha eleitoral.
“O Tribunal Eleitoral considerou que o conteúdo encorajava as pessoas a votar em uma determinada opção política, violando assim o princípio constitucional da separação entre Igreja e Estado. A Conferência Episcopal do México criticou esta decisão, dizendo que ela violou a liberdade de expressão dos membros do clero”, apontou a ACN.
Chile
Ataques a locais de culto perpetrados por grupos ligados ao crime organizado e ao narcotráfico na região de Araucanía, se aproveitando das reivindicações de terras feitas pelos mapuches, foram um dos motivos citados pela ACN para
colocar o Chile na categoria “sob observação”.
A organização também mencionou uma atitude do presidente Gabriel Boric, que em setembro do ano passado se recusou a aceitar as credenciais apresentadas pelo embaixador de Israel, após ser informado do suposto assassinato de um adolescente palestino em uma operação do exército israelense. “Reagindo ao incidente diplomático, a Comunidade Judaica do Chile (CJC) repreendeu o presidente pela ação”, lembrou a ACN.
A organização católica apontou ainda que a proposta de uma nova Constituição para o Chile, rejeitada em referendo em 2022, poderia ter criado “incerteza” sobre a proteção da liberdade religiosa garantida desde a Carta Magna de 1925.
Argentina
Na parte do relatório dedicada ao país governado pelo peronista Alberto Fernández, a ACN incluiu denúncias do Conselho Argentino de Liberdade Religiosa (Calir) de que restrições devido à pandemia de Covid-19 atingiram fortemente locais de culto.
O Calir apontou que estas normas foram adotadas “sem ação” do Congresso argentino e que, de acordo com a Corte Interamericana e a Comissão de Direitos Humanos, “as medidas sanitárias nunca podem levar à suspensão de direitos
fundamentais”.
Outro ponto relatado foram os ataques contra igrejas promovidos durante manifestações da organização feminista pró-aborto Ni Uma Menos.
Outras denúncias do Calir foram mencionadas no documento da ACN: um pedido do conselho ao Congresso argentino para que suspendesse a aprovação da Convenção Interamericana contra Todas as Formas de Discriminação e
Intolerância, argumentando que, “pela forma como a convenção é concebida, pode se tornar uma ferramenta para restringir severamente certas liberdades fundamentais, como a liberdade de religião, expressão e educação”; e uma
denúncia contra a presidência do Superior Tribunal de Justiça, que fez questionamentos a candidatos a cargos na procuradoria da cidade de Cipoletti, na província de Rio Negro, sobre suas crenças religiosas, sob a justificativa
de que estas poderiam afetar a “independência dos juízes”.
“A combinação de violência social e medidas governamentais sugere que as perspectivas de liberdade religiosa pioraram [na Argentina] e devem continuar sob observação”, concluiu a ACN.
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