Em 2019, o empresário Elon Musk começou a construir uma grande fábrica da Tesla em Xangai, o núcleo financeiro da China, que um ano depois passaria a substituir a de Fremont, na Califórnia, como a maior e mais produtiva de seu império automobilístico. O local se tornou a principal entrada de lucro da empresa, respondendo por mais da metade das entregas globais e deixando a fortuna do magnata dependente.
Os negócios do magnata em Pequim decolaram nos primeiros anos, contribuindo para mantê-lo entre os grandes bilionários do mundo. No entanto, a relação com o gigante asiático tem mudando com a consolidação crescente de empresas chinesas no mercado dos carros elétricos.
No mês passado, a Tesla registrou, pela primeira vez em quatro anos, uma queda nas vendas de veículos. Essa é a prova mais recente de que o domínio global da maior companhia do setor está perdendo fôlego frente à concorrência e parte da culpa é de seu dono.
Isso porque Musk ajudou a criar a indústria de veículos elétricos na China, com a BYD sendo sua principal rival atual no mercado.
As fabricantes de automóveis chineses como BYD e SAIC deram um salto na conquista de terreno na Europa, colocando em xeque empresas consolidadas, como Volkswagen, Renault e a dona da Peugeot, Citröen, Fiat e Jeep (Stellantis), por exemplo. Nos EUA, a Ford e a General Motors (GM) também correm atrás do prejuízo.
No começo, a construção da mega fábrica de Xangai parecia uma vantagem para Musk, uma vez que o regime chinês impõe menos restrições trabalhistas aos empresários do que nos EUA, possibilitando longas jornadas de trabalho, e o custo de produção é bem menor, fatores que foram levados em conta pelo bilionário.
Além dos benefícios financeiros, o magnata conseguiu influência política no país asiático, se aproximando de lideranças como o atual primeiro-ministro chinês, Li Qiang, que à época já era um importante oficial de Xangai.
Essa relação foi de mão dupla, já que a China também se interessou pela presença da gigante dos carros elétricos em seu território, enquanto gerava uma série de benefícios para o empresário. Tanto é que a Tesla passou a utilizar baterias e peças fabricadas localmente, contribuindo em troca com fornecedores chineses para o desenvolvimento de tecnologias envolvendo carros elétricos e treinamento para a formação de uma geração qualificada.
Uma reportagem do jornal americano New York Times revelou que no período em que a fábrica tomava forma em Pequim, Musk trabalhou estreitamente com Qiang e, sob sua supervisão, conseguiu empréstimos com juros baixos em bancos estatais chineses. A China também mudou algumas regras que envolvem empresários estrangeiros para que a Tesla pudesse se estabelecer sem um parceiro local, algo que não é visto com frequência em uma ditadura que busca controlar todos os setores do país.
Documentos consultados pelo jornal também revelaram que Musk ganhou milhões de dólares em créditos do governo da Califórnia, enquanto investia na China, por meio de uma política ambiental que concede créditos aos fabricantes de automóveis para produzir “carros limpos”. De acordo com dados oficiais, o Sistema de Negociação de Emissões (ETS, na sigla em inglês) da Califórnia, um dos maiores do mundo, rendeu à Tesla cerca de US$ 3,7 bilhões (R$ 18,7 bilhões), de 2008 a 2023.
A crescente concorrência com a China se tornou uma preocupação política para os EUA, que possuem contratos “delicados” com outra empresa de Musk, a SpaceX, mas o magnata já deu declarações sobre a separação dos negócios. Segundo ele, “suas empresas não deveriam ser confundidas”.
O ditador chinês, Xi Jinping, já afirmou ter planos para tornar o país uma “potência automobilística” nas próxima década. A aposta do líder comunista está baseada no crescimento do gigante asiático em “três motores”: o de veículos elétricos, baterias e energia renovável, proposta que coloca em risco a liderança global da Tesla.
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